Consumindo teorias
sociais como canais de TV
Escolhendo teorias sociais para seguir
Reprodução de Internet. Link abaixo. |
Em
uma pesquisa financiada pelo ministério da ciência, tecnologia e
desenvolvimento para estudantes de graduação (Iniciação Científica), do ano de
2014 até 2015, eu estudei “como cientistas sociais aderiam a certas teorias e
não outras”. Selecionei teorias de gênero e teorias pós-coloniais. Sendo uma
pesquisa qualitativa, eu não podia dizer que os resultados da minha pesquisa poderiam
ser generalizados. Ou seja: não poderia dizer que o que descobri se aplicaria a
todos os e as cientistas sociais.
Minha
conclusão foi que: 1) a teoria precisa estar circulando (ela precisa existir e
ter chegado por meio de pessoas e literatura especializada e em idiomas
acessíveis, normalmente, no caso da pesquisa, em língua portuguesa); 2) existe
a importância de ter orientadores/as e grupos de estudo, no início, lidando com
o assunto, pois a grade curricular antiga de uma instituição não é sempre flexível,
normalmente ela ensina “os clássicos”, mas não o assunto, digamos, “da nova
geração” ou da “moda mais recente”; 3) “da moda mais recente” existem também os
“corredores” e os círculos de trocas entre estudantes e influências externas –
aqui os últimos 30 anos foram, tecnologicamente, bastante transformadores, já
que fotocopias e a territorialidade nova, da internet, das tecnologias de 3g e
4g de smartphones, expandiram a circulação de literatura especializada,
pirateada e não somente, dentro e fora das universidades; 4) a escolha pessoal
do e da cientista social está ligada, como em qualquer outra área, a motivações
pessoais “práticas” (respectivamente: a teoria é emancipatório e crítica ou
não? Ela se alinha ao que grupos e movimentos sociais defendem ou não e, por
fim, as consequências de seus usos vão ter resultados efetivos para mudança
social desejada, ou não? Se as teorias não se encaixarem nesses parâmetros, a
regra hipotética que assumo é que elas são descartadas, normalmente de modo
sumário).
Adesão aos canais de TV
Ora,
até a década de 2000, no Brasil, a TV ainda era algo incomum nas periferias e
casas de pessoas pobres. De onde vim tivemos TV nessa década (eu era uma
criança), apesar de ter sido esforço de um trabalho descomunal de minha família
(artistas plásticos) para comprar uma Mitsubishi às curtas de um mil pratinhos artesanais
pintados individualmente para um casamento cuja cliente era uma poetisa e seu
esposo, um político “adinheirado” e, mais tarde, mal afamado. Na década de
2000, contudo, a novidade eram os computadores, já os celulares, ainda eram 1g
e 2g. Foi na metade desta década que tive um primeiro computador, sem internet;
no final, tive outro, mas ainda sem internet. Foi no finalzinho, com as
lan-houses, que comecei a me familiarizar com a internet e com computadores,
podendo ter, finalmente, um computador (notebook) com internet posteriormente.
Alguns anos depois entrei na universidade. Lá, fotocópias de textos eram mais
comuns. Na segunda metade do 2010, contudo, o uso da Internet e, diante da
pandemia, 2020, a Internet se tornou a infraestrutura fundamental para
continuidade das atividades acadêmicas. Mas e as TVs?
Ilude-se
quem acredita que elas “sumiram” e que ninguém mais assiste. Mas, mais
importante, “como escolher um canal para assistir”? Você já parou para notar
que seria possível identificar, quantitativamente, as preferências de pessoas por
canais específicos conforme geração, classe social, gênero, raça, etnia, região
do país, grau de ensino, ocupação etc.? A questão é: como as pessoas escolhem
um canal e abandonam outro? Ora, como qualquer acadêmico ou acadêmica escolhe
sua teoria, em Sociais, assim como um biomédico escolhe seu curso e,
posteriormente, seus campos de pesquisa.
A
questão que resta, seria: se TV e Teorias Acadêmicas são diferentes atividades,
mas tem em comum a ideia que você ESCOLHE uma alternativa em relação a outras
tantas, então isso também se aplicaria as escolhas de TEORIAS NATURAIS e
MATEMÁTICAS? Bom, existem sociólogos que dizem que sim, ou seja, existiria uma
causa “social” por trás do sucesso de um tipo de conhecimento em detrimento de
outros (mesmo na matemática, por exemplo). Esta teoria, contudo, foi
abandonada.
Por outro
lado, ao aproximarmos as diferentes Ciências, nos deparamos com a separação
entre TÉCNICA e POLÍTICA. Se as escolhas de Teorias Sociais estão, via de
regra, ligadas às escolhas políticas, o oposto seria que a escolha técnica
estaria fora delas. O que, óbvio, é um mito. Todavia, ao colocar essa questão
nesses termos, ao menos em Sociais, reproduzimos, erroneamente, a lógica da
escolha do canal de TV: ou seja – a escolha pela TÉCNICA (ou canais) é uma
escolha conformista e não posicionada (como assistir novelas, programas de
auditório na TV).
Resultado:
a escolha de cientistas sociais classifica a teoria do mesmo modo que a
política da TV. Escolha o canal contra a Direita, assim como a teoria
Politizada. Mas nem só de verdade sociológica e antropológica vivem as pessoas.
Em segundo lugar, respeitar as outras áreas e as pessoas (senso comum é um
termo pejorativizado) é necessário. Em terceiro lugar, é possível combater
desigualdades sociais não apenas com teoria social crítica. Em quarto lugar,
outras ciências podem ser aliadas, mesmo a biomedicina e a Saúde em geral,
basta que “sentemos” para propor alternativas e avanços com dimensões ainda não
exploradas naqueles campos (já pensou em fazer uma pesquisa “meramente”
descritiva, mas que demonstre como a infraestrutura sanitária, etnograficamente
observada, constrói um ambiente favorável às disseminações de doenças e
viroses, demonstrando, assim, que ações governamentais tem sido insuficientes;
ao mesmo tempo em que propostas da OMS não se aplicam a todos os lugares devido
às especificidades de cada local? E, também, que as pessoas que são chamadas de
“senso comum” têm ativamente promovido ações contra essas desigualdades sem a
necessidade de ajuda, mesmo que bem vinda, do “saber acadêmico”? Pois é... nem
a TV é passava, nem as pessoas).
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