quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Como aterrar o capitalismo ou como não cair na retórica da oposição

 

           


No esforço de tentar seguir conceitualizando minimamente essa “entidade” chamada capitalismo, vou lembrar do velho Marx e do Engels. Basicamente, para pensar em capitalismo, você tem que pensar em trabalho.

            A relação entre trabalho e capitalismo, portanto, é um ponto de partida. O segundo ponto é a circulação de moeda (valores). Por isso, por exemplo, a existência de um circuito de troca de objetos e serviços por moeda, vem, historicamente, antes do capitalismo. Mas ela é a condição para a existência do capitalismo (ou seja: CAPITALISMO NÃO É SINÔNIMO DE CONSUMISMO, NEM DE MERCADO, NEM DE COMÉRCIO e NEM DE LUCRO).

            Um terceiro ponto é a relação entre trabalho e objetos de trabalho (meios de produção). Essa relação é condição para ocorrer a troca do tempo de trabalho da mão de obra pelo dinheiro de um empregador ou empregadora. O que Marx e Engels defendiam era que essa relação fosse extinta! Somente assim o trabalhador e a trabalhadora seriam livres, afinal, seriam donos e donas dos “objetos” necessários ao trabalho. Em outras palavras: seriam donos e donas das industrias e fábricas, sendo, ao mesmo tempo, mão de obra e gestores. Mas vamos lembrar que Marx não está falando de “pessoas” (indivíduos), mas de classes, que são, basicamente, coletivos de pessoas que possuem condições materiais em comum, como ser dono ou não de fábricas e indústrias ou não ter propriedades ou terras.

            O capitalismo, afinal, é esse conjunto de relações e condições que fazem com que o trabalhador ou trabalhadora não tenha suas terras ou meios de trabalho (o que os e as faz buscar emprego). A ideia de empreender ou ser autônomo não significa estar fora do capitalismo, por exemplo. Como disse, a existência do mercado e da circulação de moeda que permite a troca de coisas e serviços por dinheiro sustenta qualquer sistema econômico e, neste caso, o capitalismo. Por isso, toda vez que você compra ou vende alguma coisa, você alimenta o mercado e a circulação de moeda. Inclusive, é por isso que as greves não apenas param a produção e diminuem o lucro, mas também se refletem na paralisia da circulação de mercadorias, o que aparece nos preços.

            Não basta, inclusive, ser um/a “empreendedor/a humanizado”. Se você está falando de ir contra o capitalismo, então a ética não muda o fato de existirem todas as relações e condições anteriores (um mercado, uma circulação de coisas e dinheiro, e pessoas sem terras ou meios de trabalho). Além disso, entra a figura do Estado, da Lei e do Direito, que regulam o que Marx e Engels chamaram de exploração da força de trabalho. Já viu que as greves podem ser consideradas ilegais? (Irônico, não?)

            Calma, a culpa não é a sua. Você nasceu em um mundo desigual. No século XIX, Marx e Engels defendiam a luta armada para tirar o poder do Estado; tirar as fábricas e indústrias das mãos de seus donos e donas (burguesia). Com isso, tal como na Revolução Francesa, seria a Lei (Constituição) modificada de um lado, e, de outro, dar-se-ia os meios de trabalho para a classe trabalhadora e, ao mesmo tempo, ela seria também sua mão de obra (ou seja: o princípio é COOPERATIVO). O grande problema, para algumas tradições marxistas, é que, na prática, os trabalhadores/as da Europa, de Cuba e na China não se tornaram “donos dos meios de produção”, mas sim empregados agora dos gestores do Estado. É o que alguns chamam de “golpe dentro do golpe”.

            Em suma: a ideia é simples. Para romper com o capitalismo é preciso: 1) tirar os patrões do poder; 2) tirar o Estado das mãos de seus atuais governantes; 3) dar terra e os meios de trabalho para quem deseja; 4) fazer outra Lei (constituição) para regular o Estado dos e das trabalhadoras. Ao se fazer isso, ao menos inicialmente, a ideia é que a produção seja direcionada para o fim da desigualdade social com a distribuição dos produtos do trabalho para toda a população conforme sua necessidade. Nesse “paraíso” utópico, não haveria fome. Seria a partir daí, inclusive, que Marx e Engels diriam que começaria a verdadeira “História da Humanidade”, pois ainda vivemos, segundo eles, a pré-história (sim, eles acreditavam no mito da História com H, daí sua teoria ser chamada de materialismo histórico e dialético).

            Por fim, falar em qualquer coisa sobre “consumismo” etc., é olhar pro lado errado. E não se engane. Esse papo tem esse propósito mesmo: concentrar a atenção sobre as pessoas que são “consumistas” ou “consomem conscientemente” e “fazem sua parte”, “pensam no próximo” etc., etc.,; ou então os papos sobre “comunismo de iphone ou “esquerda caviar”, etc.,; ou, ainda, empreendedorismo “humanizado”, “consumo consciente”... são coisas que resultam de uma sociedade essencialmente capitalista. Não é que sejam problemas em si, essas coisas. Mas sim que elas não mudam o fato de que o capitalismo não vai deixar de existir. Ponto final.

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