Gabriel Ferreira de Brito
Resumo
O objetivo deste ensaio é refletir
sobre a prática científica e sua relação com axiomas, paradigmas e pressupostos
extra-empíricos que compreendem o fazer ciência. Para tanto, parto da
contribuição de pesquisadores e pesquisadoras de metodologia qualitativa, como
Norman K. Denzin e Yvonna S. Lincoln (entre outras/os); de renomados
antropólogos, como Tim Ingold e Stanley Barret; e de sociólogos como Bruno
Latour e Jeffrey Alexander. Parte das referências são obrigatoriamente
extraídas da ementa da disciplina de Métodos Qualitativos de Pesquisa Social,
do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de
Pernambuco (2017.2), visto se tratar de requisito para aprovação na referida
disciplina. Na primeira parte, um panorama das ciências sociais na segunda
metade do século XX é apresentado; no segundo momento, um exemplo prático
(etnográfico) da relação entre pressupostos e teoria (ator-rede) é fornecido no
intuito de ilustrar a relação entre empiria e teoria; na terceira parte, o
intercâmbio entre características de diferentes epistemologias (e paradigmas) é
discutido. Como resultado: argumenta-se que a etnografia fornece um importante
subsídio para uma flexibilidade e não engessamento em axiomas e paradigmas
específicos. Do mesmo modo com que se conclui que não é possível intercambiar
axiomas e pressupostos entre paradigmas de maneira aleatória ou acidental, pois
existem conflitos ente axiomas de diferentes paradigmas – como é o caso,
sugere-se, de teoria ator-rede e de teorias pós-coloniais.
Palavras-chave:
Axiomas. Paradigmas. Ciências Sociais. Etnografia. Pressupostos.
Preâmbulo
Numa obra considerada polêmica para
sua época, o pintor austríaco Gustav Klimt (1862-1918) retratou a deusa grega
Pallas Athenas (1898) de uma maneira considerada um tanto “moderna”. Pode-se
dizer que sua visão artística ressignificou em numa nova moldura a justiça,
civilidade, sabedoria e cultura que a deusa representava;
substituindo esse significado por um simbolismo erótico que chocou a moralista
Viena de seu tempo. Coincidentemente, as ciências sociais vêm, desde o século
XIX, institucionalizando-se em um meio, aparentemente, tão pudico quanto[1]. Pouco mais de meio século
depois da Pallas Athenas de Klimt, David Bloor, da escola de Edimburgo,
intitulou a conclusão de seu principal trabalho (2009 [1976]) de “Ciência e
Heresia” (Science and Heresy), afirmando
que determinadas críticas dirigidas ao seu “Programa Forte” (Strong Programme) em sociologia do
conhecimento foram as mesmas críticas dirigidas à historiografia da Igreja da
Escola de Tübinger, por parte de dogmáticos religiosos no século XIX que criticavam
a “profanação” do pensamento sacro. A contemporaneidade é mais progressista que
o conservadorismo desses tempos passados?
Este ensaio orna-se com o luxo
dourado da obra de Klimt, “reenquadrando” a relação entre axiomas e paradigmas
em ciências sociais, e dando-lhes uma nova moldura, sem com isso passar do
simbolismo da Athenas de Klimt do século XIX para um dadaísmo fragmentário
pós-moderno.
Na primeira parte deste ensaio, é
apresentado um panorama do desenvolvimento dos interesses pela metodologia qualitativa
na segunda metade do século XX, com destaque para a variedade de escolas (em
sociologia e antropologia) que se aglutinam no que chamar-se-á de axiomas e
paradigmas à guisa de trabalhos que serão citados em tempo. No segundo momento,
um exemplo da relação entre etnografia e teoria ator-rede (sociologia) será
dado no intuito de esboçar a relação entre as escolhas de: paradigma, axiomas e
a prática de pesquisa científica. A terceira parte deste trabalho é
comparativa. Nela, características de diferentes epistemologias (e paradigmas)
é discutida, no intuito de ilustrar alguns limites em tal operação. Por último,
a conclusão traz algumas reflexões sobre a importância da etnografia como
“fermento” para novos modos de ver – e de se fazer ciência social.
Parte I Axiomas e paradigmas
Durante meados da década de 1970, um
então professor da Universidade de São Paulo, José Jeremias de Oliveira Filho
desenvolvia pesquisas sobre interesses vigentes, à época, pela chamada
“metateoria” e, por conseguinte, metodologia teórica das ciências sociais cujo
andamento, segundo o professor, ainda estava em seu início (1976). Mais
recentemente, uma socióloga da Universidade Federal de Pernambuco publicou um
trabalho sobre tema semelhante – metametodologia das ciências sociais (HAMLIN,
2011). Ele e ela têm em comum, portanto, um interesse na discussão
extra-empírica. Algo que permeia os debates sobre o caráter científico das
ciências sociais – e cujo debate remonta aos primórdios positivistas da
instituição de tal área.
Também na segunda metade do século XX, ninguém
menos que Jeffrey Alexander (1987) prosseguia com debates – em um contexto
internacional – sobre questões que vão além da prática científica de campo
(empiria). Isto é, ele falava de pressupostos (pressupositions) que não se resumem à experiência empírica de
pesquisa. Grosso modo, Alexander (1987), Hamlin (2011) e Filho (1976) estão nos
dizendo coisas semelhantes, mas de modos distintos. A saber: a ciência (e sua
objetividade) é feita a partir de escolhas, motivos e razões que extrapolam a
pesquisa empírica e observacional de fenômenos dados. Dito de outra maneira: ao
fim e ao cabo, a ciência é construída por tomadas de decisões que levam em
conta n’ variáveis extra-científicas (desde quais perguntas se deve colocar em
um survey, qual corrente teórica
escolher, qual método é mais adequado para isso ou para aquilo, qual ideologia
corresponde à determinada abordagem, qual o posicionamento político
subentendido, quem tem interesse em financiar tais pesquisas... etc.).
O contexto internacional da produção
científica, neste caso (terceiro quarto do século xx), marca uma guinada do
positivismo e dos métodos quantitativos de pesquisa para os métodos
qualitativos de pesquisa (SCHWANDT, 2006). Num trabalho sobre epistemologia e
investigação qualitativa, Thomas A. Schwandt, professor de educação e reitor
adjunto da Indiana University,
contextualiza o período em que se desenvolveu o “movimento reformista” que
oxigenou o campo de pesquisas qualitativas. Algo que fez com que o
interpretativismo, a hermenêutica e construcionismo social ganhassem cada vez
mais espaço em teoria social (SCHWANDT, 2006, p. 193-218).
No campo da antropologia não foi
diferente. Segundo o professor Stanley Barrett (2015), professor de ciências
sociais na University of Guelph,
Ontario, Canadá, o primeiro momento da disciplina data do século XIX, na qual
seu estatuto científico estava em construção[2]; no segundo momento, a
antropologia saía do “período colonial”, por assim dizer, com novas teorias se
desenvolvendo; e, por último, vieram o pós-modernismo e a antropologia
feminista. Antes disso, tal como mencionado por Schwandt (2006) sobre a
emergência dos métodos qualitativos de pesquisa, a teoria da ação social, de
Weber, também influenciou o desenvolvimento da antropologia no segundo quartel
do século XX (BARRET, 2015, p. 120).
Diversas “novas sociologias”
(sociologia existencial, teoria ator-rede, teoria da ação criativa, sociologia
fenomenológica etc.) se desenvolveram no último quarto do século XX (ALVES,
2010). Entre 1980 e 1990, no exterior, os estudos pós-coloniais também
começaram a fazer parte dos debates sobre teoria social e teoria crítica
(BARBOSA, 2010; COSTA, 2006; DIRLIK, 1997); no Brasil, tais estudos parecem ter
ganho mais fôlego a partir da década de 2000, tendo iniciado aproximações com
estudos de gênero, ao menos em Recife e alguns estados, a partir dos anos de
2010 (BRITO, 2015). Já os estudos de gênero, no Brasil, seguindo a esteira
internacional já aludida neste texto (BARRET, 2015 etc.), vieram antes, durante
os anos 1980, conforme assinalou a socióloga marxista e feminista Heleith
Saffioti (2005), poucos anos antes de seu falecimento.
Diante de um amplo contexto, e aqui só se
abordou sociologia e antropologia da segunda metade do século XX, vê-se que em
diferentes lugares, aspirações, debates e temas têm roubado a cena. Alguns de
maneira mais duradoura, outros nem tanto. Contudo, diferente de teorias e
metodologias, existem termos mais amplos como paradigmas, que delimitam um horizonte
maior de alcance do que debates apenas sobre assuntos pontuais.
No que tange a prática científica,
Yvonna S. Lincoln e Agon G. Guba (2006) falam de axiomas que permeiam os
paradigmas científicos. Os axiomas que norteariam tais paradigmas definem suas
ontologias, metodologias e epistemologias. Como exemplos, a ontologia
positivista teria um “realismo ingênuo”, enquanto a teoria crítica e outras se
basearia no “realismo histórico”; construtivistas no “relativismo” etc. Tal
como já observado em relação à metametodologia (HAMLIN, 2011), metateoria (FILHO,
1976) ou aos pressupostos científicos (ALEXANDER, 1987), para Lincoln e Guba
(2006), “axiomas” definem como fazer a
ciência.
A questão suscitada nesta primeira
parte seria: em que medida os axiomas circunscrevem ou limitam a prática
científica e vice-versa? Preliminarmente, a suposição, quiçá hipótese, seria de
que paradigmas circunscrevem o modo como problemas de pesquisa podem ser
investigados, mas não impedem o intercâmbio de teorias e métodos, contanto que
se façam as devidas adaptações (e isso só se resolve na prática, em campo). Por
outro lado, além dos axiomas, a axiologia joga um papel fundamental na escolha
dos paradigmas. Entretanto, talvez seja melhor falar em pressupostos, deixando
axiologia para seu respectivo campo filosófico (LINCOLN e GUBA, 2006)). Por
isso, é preciso admitir que, em alguma medida, aceitamos e escolhemos sermos
influenciados e influenciadas por outros/as que vieram antes e que, ao
abrirmo-nos para a “subjetivação”, para o download
de “ideologias”, e de ciências “críticas” (ou não), também aceitamos portar
suas gramáticas como molduras para nossas indignações. Todavia, as molduras que
utilizamos nos limitam para outros paradigmas tanto quanto os paradigmas nos
limitam para nossas molduras.
Parte II breve discussão sobre etnografia e método: notas de campo
Até aqui foi apresentado um esboço
de diferentes escolas que vêm se desenvolvendo em ciências sociais desde a
segunda metade do século XX. Além disso, observou-se que tais campos estão
inextricavelmente circunscritos em paradigmas científicos e, por conseguinte,
isto significa ter vantagens e desvantagens quanto à pesquisa científica.
Agora, será apresentada uma discussão sobre o papel da etnografia em relação
aos paradigmas científicos. Nem de longe se busca exaustividade sobre o
assunto; o objetivo é apenas trazer teóricos atuais da área de antropologia que
vêm problematizando o papel da etnografia. Espera-se com isso que a relação
entre axiomas, pressupostos e paradigmas seja percebida como um exercício
continuo e indefinido. O que tem como consequência definir que somos treinados
de acordo com o paradigma que nos inserimos, mas assumir sua moldura não
significa estagnação e estase, mas sim “ir adiante” e, se necessário, sugere-se:
deveríamos superar as limitações tanto dos paradigmas, quanto nossas próprias
convicções.
Por que escolher etnografia para
levar adiante a discussão aqui em pauta (axiomas, pressupostos e paradigmas)? A
etnografia é um campo de pesquisa que compartilha com o campo da história
alguns aspectos em comum. Segundo Ingold (2015), ambos são campos idiográficos. O que significa que são
modos de descrição escrita exaustiva
sobre algum tempo-espaço dado, independente de posições nomotéticas que, por sua vez, buscam inferir generalizações e
teorias sobre um conjunto de dados observados ou a partir deles. Mesmo assim, a
etnografia pode ser combinada com abordagens nomotéticas, e normalmente o é. Isto ocorre em sua relação com a
antropologia ou a sociologia, por exemplo. Além disso, etnografar um campo
significa imergir nele e descrevê-lo exaustivamente, entre outras
coisas (INGOLD, 2015), o que, defende-se, difere da observação-participante[3]; com a etnografia é
possível fazer uma sociologia preocupada com agencia/estrutura a partir de
diferentes paradigmas. Escolhido o paradigma, os dados são então circunscritos
num horizonte hermenêutico (teoria) – o
olhar é treinado para observar elementos específicos. Vejamos a seguinte
passagem de diário de campo:
Sobre a mesa em frente a uma mulher de cabelos
escuros, batom vermelhos e óculos de grau; camisa laranjada e calça de tecido
leve, tonalidade escura, jazia uma máquina: um computador formato notebook, diferente de computadores de
mesa conhecidos como desktops. Em
poucos instantes, outra máquina, agora um
retroprojetor lançava imagens sobre um tecido
que mais parecia uma cortina, localizado atrás da mesa na qual a mulher de
óculos de grau digitava, agilmente, comandos em seu notebook. As imagens eram de crianças, bebês de colo sendo banhados
por mãos cuidadosas, em banheiras.
[...] “Boa tarde a todos
e a todas. Mais uma edição do Diálogos em parceria com o Laboratório de História da Infância e o NINA (?)”, fala uma mulher
de meia-idade, cabelos curtos, louros, tez branca, e prossegue, “O zika vírus... Pernambuco”, “saberes da
primeira infância na Rural”. Ela
menciona convidadas, “Deyse do FAGES,
Ana Paula, Fiocruz”, “Deyse Amâncio
vai coordenar a mesa”. O nome da porta-voz é Raquel. Citam outra pessoa da Fiocruz, agora Ana Melo.
[...] Ana Melo inicia a
palestra, porém, outra máquina, agora um microfone
defeituoso, atrapalha a fala. Por trás da palestrante, imagens contínuas,
em sequência, são projetadas pela máquina chamada de retroprojetor. Na tela
(cortinas), é possível ler “Saúde e Direitos
Humanos”. Um slide – isto é: uma
imagem ou quadro em que se projeta algum conteúdo visual – traz frases contendo
datas sobre dados referentes à microcefalia. Fala-se de relações de grupo, Saúde Coletiva, impactos sociais e
econômicos decorrentes da infecção pelo
zika vírus em Pernambuco.
[...] A palestrante fala,
além do WhatsApp, da associação de mães de crianças com microcefalia: “O
filho é sacralizado; veio para mudar alguma coisa”, resgata a palestrante,
falando do acompanhamento realizado com as referidas mães, e continua,
“microcefalia não é o fim”. Assim, explica que a associação funciona como uma
rede de apoio. O WhatsApp torna-se
uma ferramenta para auxiliar na comunicação dessa rede.
[...] Algumas siglas
aparecem nos slides. MERG, FIOCRUZ, UPE, LONDON SCHOOL…,
UFPE. A palestrante diz que dessa parceria entre tais
instituições, cinco estudos estão sendo feitos no momento. Ela, então, diz que
essa é a maior pesquisa do FAGES. Mais nomes são citados, enquanto eu tento
anotá-los o mais de pressa possível: Silva Matos, Scott, Marion, Ana Cláudia,
Fernanda. Programa de bolsas de
iniciação científica (PIBICs) são mencionados. Fala-se de Sussex, parceria com universidade de lá
(salvo engano). Três anos de pesquisa e ainda estão nos primeiros meses.
Existem dois eixos de pesquisa: Políticas Públicas e Experiência de maternidade
e cuidado. Aqui já estamos em outro momento, quem fala é Luciana...
Gabriel Brito
24 de agosto de 2017
As passagens do diário de campo
transcritas acima fornecem uma ilustração: ao coletar os dados, o olhar
etnográfico, por assim dizer, estava voltado para observação da atuação de
não-humanos na cena. Não humanos podem ser objetos e outras coisas. A intenção
em observá-los é simples: identificar como tais “seres” participam ativamente
da construção da “ordem social”. Em outras palavras: como objetos e outras
entidades fazem parte das ações humanas? Ao conseguir identificar essa associação (LATOUR, 2012) entre humanos
e não-humanos, visa-se desenhar uma rede
no relato textual que será escrito pelo pesquisador. Isto
possibilitará descrever como uma ação transformou (se é o que o fez) as
relações sociais de algum lugar observado. Essa é uma abordagem baseada na
teoria ator-rede (actor network-theory).
Neste caso, o referencial é Bruno Latour (2012). As palavras-chave utilizadas
na análise são: Localizadores, Mediadores, Rede e Ação. Vide a tabela abaixo:
Localizadores (“estrutura”)
|
Mesa, tecido (tela de retroprojeção)
|
Mediadores (“transformam informações/participam ativamente”)
|
Notebook, retroprojetor, microfone, WhatsApp.
|
Rede (“instituições atuando coletivamente/humanos e entidades
coletivas”)
|
Diálogos, Laboratório de História da Infância (NINA), saberes da
primeira infância na Rural (UFRPE), FAGES, Fiocruz. Saúde Coletiva. Mães. Zika. MERG, UPE, London School of Economy. Bolsas
de Iniciação Científica. University of
Sussex.
|
A ação (“o que aconteceu/como vem acontecendo”)
|
Comunicação acadêmica: Seminário
sobre Saberes da Primeira Infância, zika vírus e Microcefalia.
|
A tabulação aqui é meramente
ilustrativa. Contudo, isso não impede com que sejam extraídos os elementos
necessários para encenar ou esboçar um exemplo para o tema em pauta (axiomas e
paradigmas em ciências sociais). Dividindo em três níveis classificatórios, é
possível distinguir os elementos que se interpenetram na pesquisa: 1)
observação/empiria; 2) marco teórico; 3) paradigma-axiomas (e pressupostos).
A observação in situ possibilita uma maneira específica de coleta de dados; o
marco teórico circunscreve o “como olhar, o que olhar” na observação; por
último, os paradigmas-axiomas delimitam os horizontes teóricos em uma “família”
mais abrangente que comportam diferentes teorias. Retomando o exemplo de
Lincoln e Guba (2006), axiomas delimitam a epistemologia, a ontologia e a
metodologia concernentes a um dado paradigma e, assim, incidem sobre o que será
empregado na pesquisa. Mais acima foi dito que o que se busca com a teoria
ator-rede é identificar a participação (e associação) de não-humanos na ação.
Se, por outro lado, a ideia fosse partir de uma sociologia compreensiva, seriam os significados atribuídos às ações sociais
que estariam em primeiro plano, permitindo ao analista identificar as
diferentes intenções intersubjetivas em torno da microcefalia; caso a
observação partisse de uma terceira abordagem, a funcional estruturalista, se
buscaria, quem sabe, identificar como as instituições sociais encontradas na
observação estariam reconfigurando a solidariedade social em torno da
microcefalia...
Em suma: a coleta e a análise
teórica estão condicionadas por uma visão de mundo (ontologia), uma forma de
coletar e analisar os dados (metodologia), e por uma concepção sobre o que é
conhecimento válido/legítimo em dada área científica (epistemologia). Tais
elementos estão inter-relacionados e compõem um determinado paradigma
científico. O exemplo acima é apenas isso, um exemplo específico a partir do
que vem se chamando de sociologia pós-social (KNORR CETINA, 1997). Sociologia
esta que inclui a interobjetividade no campo da agencia (VANDEMBERGHE, 2006).
Parte III limites teórico-metodológicos
entre cruzamentos
Neste terceiro momento, o objetivo é
comparativo. Axiomas pertencentes a determinados paradigmas não podem ser
intercambiados com tanta simplicidade como pode parecer à primeira vista. É
relativamente comum ver trabalhos que misturam uma gama de autores e autoras
sem preocupação com os limites hermenêuticos subjacentes a tais combinações[4]. Por isso, a intenção aqui
é ilustrar esses limites a partir de alguns exemplos.
Retomando um texto base para a pauta
aqui presente, lê-se:
Tentamos, contudo, incorporar
perspectivas de outros grandes paradigmas não-positivistas [...] O que
esperamos fazer neste capítulo é familiarizar o leitor com as correntes, os
argumentos, os diálogos e os textos provocativos e a teorização mais
abrangentes, para que talvez possam ver, da melhor maneira possível, o que nós
mesmos ainda não enxergamos: onde e como a confluência é possível, onde a
reconciliação construtiva pode ser negociada, onde as vozes estão começando a
alcançar alguma harmonia? (LINCOLN e GUBA, 2006, p. 177).
Como intercambiar axiomas? Isto é
possível? Em outras palavras: podemos retirar conceitos, abordagens, técnicas e
métodos de um paradigma e utilizar em outro sem, com isso, criar um
Frankenstein antitético? Dois exemplos podem ilustrar essa questão. No prefácio
à tradução para o português do livro Pode
o subalterno falar? (Can the
subaltern speak?), de Gayatri Chakravorty Spivak, a professora Sandra
Regina Goulart Almeida diz o seguinte:
[...] Na análise de Spivak, há uma
relação intrínseca entre o “falar por” e o “re-presentar”, pois, em ambos os
casos, a representação é um ato de fala em que há a pressuposição de um falante
e de um ouvinte. A autora argumenta que o processo de fala se caracteriza por
uma posição discursiva, uma transação entre falante e ouvinte e, nesse sentido,
conclui afirmando que esse espaço dialógico de interação não se concretiza
jamais para o sujeito subalterno que, desinvestido de qualquer forma de agenciamento,
de fato, não pode falar. (SPIVAK, 2010, p. 13).
É importante destacar o teor da
citação, pois a palavra “jamais” dá o tom da mensagem, corroborando-se com a
conclusão de que o subalterno “não pode falar”. Mas Spivak não se resume à
crítica ao pressuposto de que na “posição discursiva” o subalterno “jamais pode
falar”, ela avança e critica a postura do intelectual, conforme pode-se
observar na citação seguinte:
[...] Essa exclusão da necessidade da
difícil tarefa de realizar uma produção ideológica contra-hegemônica não tem
sido salutar. Acabou por auxiliar o empirismo positivista –
o princípio justificável de um
neocolonialismo capitalista
avançado – a definir sua própria arena como a da “experiência concreta”, “o que
realmente acontece”. De fato, a experiência
concreta que garante o apelo político
de prisioneiros, soldados e
estudantes é revelada por meio da experiência
concreta do intelectual, aquele que diagnostica a episteme. Nem Deleuze,
nem Foucault parecem estar cientes de que o intelectual, inserido no contexto
do capital socializado e alardeando a
experiência concreta, pode ajudar
a consolidar a divisão internacional do trabalho (SPIVAK, 2010, p. 30. Grifos
nossos).
A autora interliga habilmente
pressupostos políticos ou extra-empíricos (neocolonialismo) à epistemologia
(empirismo positivista/experiência concreta) ao denunciar o intelectual
(Deleuze/Foucault) que, ao não produzir uma ideologia contra-hegemônica, acaba
ajudando a “consolidar a divisão internacional do trabalho”. No quesito axioma,
a leitura sugere que a epistemologia empregada por Deleuze e Foucault, segundo
Spivak (2010), ignora um pressuposto – uma questão extra-empírica de cunho
político (neocolonialismo e divisão do trabalho). O que resumidamente significa
que os intelectuais mencionados ignoram um elemento axiológico (ético ou
valorativo) que, para Spivak, deveria fazer parte da análise (ou preocupações)
de Deleuze e Foucault.
O exemplo deste caso não poderia ser
mais ilustrativo. Numa classificação a partir da Lincoln e Guba (2006), Spivak
estaria dentro de um paradigma de “teoria crítica” (ver LINCOLN e GUBA, 2006,
tabele 6.5, p. 175), o qual busca, grosso modo, “emancipação social”; enquanto
Deleuze e Foucault poderiam, quem sabe, estar dentro do paradigma pós-estruturalista
(construcionista), não tendo, por isso, nenhuma pressuposição a priori sobre questões axiológicas (ao
menos não na definição de Lincoln e Guba (2006)).
O segundo exemplo desta seção pode
ser o da segunda parte deste ensaio. A teoria ator-rede vem de uma tradição que
passa pelos estudos de ciência e tecnologia (sciency and tecnology studies) (LATOUR, 2000), estudos de
laboratórios (laboratories studies) e
da sociologia do conhecimento científico de Edimburgo (cf. BLOOR, 2009 [1976];
LATOUR, 1997 [1978]) – além disso, seus defensores buscam resgatar o pensamento
de Gabriel Tarde sobre uma sociologia
associativa, ao invés da escola sociológica durkheimiana (cf. LATOUR, 2012;
VARGAS, et. al. 2014; LEMOS JR, 2017). Disto isto, no exemplo da observação-participante
realizada na ocasião do seminário sobre zika vírus e microcefalia, o objetivo
subjacente à observação era identificar a rede
de associações que estava em torno do zika vírus. Ao fazê-lo, os fios da
rede entre Fiocruz, UFPE, UFRPE, e outras instituições, começam a ser (d)
escritos no texto (relato científico) do analista. Entretanto, no modelo de
redes latouriano (1994), não cabe ao analista inferir relações causais
(positivismo) entre os fatos observados; tampouco deveria ser buscada a
compreensão intersubjetiva dos atores humanos sobre os sentidos e significados da
ação (interpretativismo). De um só golpe, duas epistemologias são deixadas de
lado, abrindo-se espaço para um paradigma cujos axiomas (epistemologia,
metodologia e ontologia) dialogam mais com um construtivismo pós-estruturalista
(VANDEMBERGHE, 2006).
O que é possível extrair dos dois
exemplos? Existem ao menos duas limitações nos paradigmas (e seus respectivos
axiomas): 1) não existe um paradigma que possa abordar todo e qualquer problema
de pesquisa[5];
2) algumas teorias (e seus conceitos) não podem se encaixar em outro paradigma,
pois axiomas de outros paradigmas anulam-se mutuamente.
Semelhante à etnometodologia no
quesito origens fenomenológicas, ao menos no que tange o efeito de “por a
realidade entre parênteses” (cf. PETERS, 2011; ARAÚJO, 2012), a teoria ator-rede
não possui uma ontologia a priori (por
mais que se atribua ao Latour de “Jamais fomos modernos: ensaios de
antropologia simétrica” (1994), uma ontologia à guisa dos rizomas de Deleuze e
Guatarri, como no plano da dança nietzschiano (VANDEMBERGHE, 2006)[6]. De todo modo: a
descritividade é um preceito da teoria ator-rede, não a nomotética e a
inferência (LATOUR, 2012). O que resulta em negar definições do tipo: a) o
social (e a sociedade) é um fato coercitivo externo aos indivíduos que mantém a
ordem social...; b) a ação humana é dotada de significado, diferente do objeto
das ciências da natureza, por isso seria a compreensão (vestehen) o objetivo das ciências sociais (cf. HAMLIN, 2011;
PETERS, 2011) ou; c) os atores possuem um “juízo dopado” (“judmental daps”)[7]
e caberia ao analista falar em seus nomes e explicar “racionalmente” o que eles
não podem fazer (LATOUR, 2012).
Resultado: a mudança de axiomas
desencadeia um conjunto de elementos (pressupostos - axiologia, ética, política
-, e axiomas - metodologia, epistemologia, ontologia -) que são concatenados ao fazer ciência e aos paradigmas
vigentes em algum período. Intercambiar axiomas e pressupostos têm seus
limites. Mas não é impossível realizar certas “confluências” - para usar os
termos de Lincoln e Guba (2006). Mais preocupante é operar pares opostos de
axiomas. Por exemplo: utilizar o conceito de solidariedade social (Durkheim),
de habitus (Bourdieu), ou de
pós-colonial em conjunto com a teoria ator-rede é ignorar diferenças
epistemológicas gritantes entre tais escolas[8].
Notas finais: epistemologia ou ontologia?
O objetivo deste trabalho foi
refletir sobre axiomas e paradigmas em ciências sociais. Concatenado a este objetivo
geral, se buscou pensar como o que Alexander chamou de pressupostos científicos
estariam em consonância com determinadas práticas científicas, em detrimento de
outras (comparação entre teoria crítica e teoria ator-rede - Parte III). De
maneira geral, o trabalho de pesquisa qualitativa de Lincoln e Guba foi de
extrema utilidade para este ensaio ao classificar axiomas como: metodologia,
ontologia e epistemologia; ao mesmo tempo em que classificava os existentes
paradigmas científicos atuais em ao menos cinco modelos gerais. Desta relação,
foi exemplificado um uso de uma teoria circunscrita em um paradigma e sua
relação com a prática etnográfica (Parte II). Feito isso, restou encontrar os
limites das combinações entre paradigmas, axiomas e pressupostos, sob pena de
acabar dando vida ao Frankenstein de Mary Shelley.
Algo que propositalmente não foi
enfatizado devido a estratégia argumentativa aqui utilizada, mas que, agora
pode ser melhor esclarecido, foi o uso da etnografia como exemplo da relação
com determinado (s) paradigma (s). No epílogo da obra “Estar Vivo: ensaios
sobre movimento, conhecimento e descrição” (2015), Tim Ingold nos diz que a
divisão entre idiografia e nomotética veio de um fundador da escola neokantista
alemã, Wilhelm Windelband, com o objetivo de distinguir o ofício do
historiador, do ofício das ciências da natureza, no século XIX (INGOLD, 2015,
p. 328). Já Ingold deseja distinguir a etnografia da antropologia, sem com isso
considerar uma disciplina como “menor” que a outra[9]. O que Ingold nos fornece
como subsídio para pensar em paradigmas, axiomas e pressupostos, é nos lembrar
que a etnografia, enquanto idiografia, nos permite coletar documentos e dados
descritivos sobre povos – em nosso exemplo da parte II – sem, com isso,
circunscrever a priori uma teoria e
um método específico de pesquisa. Dito de outra maneira: a etnografia pode ser
fluída, flexível e, por isso, pode servir como fermento para uma busca contínua
por novos modos de ver (teorias), sem que a mantenhamos acorrentada como uma
estátua grega nas ruínas da península do Peloponeso...
Axiomas/paradigmas de um lado,
teoria/metodologia do outro são, à luz da etnografia, percebidos não como um
recorte epistemológico que demarca a diferença entre ciência e senso-comum, mas
sim como diferentes modos de ser, diferentes modos de existir, de enxergar; a
cultura e o social são modos ontológicos de o humano existir, não recortes
epistemológicos. Dito de outro modo: são fabricações, artefatos; significantes
com os quais “nossa cultura” produz sua existência. Tal como ocorre com o Povo
Ojibawa do centro-norte canadense, para os quais “o mundo do sonho de uma
pessoa [...] é precisamente o mesmo que o da vida...” e “quando você acorda
[...] você está mais sábio do que estava antes”... para Ingold, “fazer
antropologia [acrescentaria etnografia], atrevo-me a dizer, é sonhar como um
Ojibawa. Como em um sonho, trata-se de continuamente abrir o mundo, em vez de buscar uma conclusão” (INGOLD, 2015. P.
341. Grifos do autor).
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2006.
[1] Baseio-me aqui no trabalho
da pesquisadora em história da arte, artista plástica e bacharel em Letras pela
USP, Mazé Leite. Fonte: blog da autora, “Arte & Ofício: um blog que fala de
arte”. Disponível em: http://artemazeh.blogspot.com.br/2012/11/gustav-klimt-um-pintor-do-seu-tempo.html.
Acesso: 26 dez. 2017.
[2]
Um rico panorama do desenvolvimento da etnografia, desde sua “pré-história” –
período das chamadas “grandes navegações” –, além da relação entre métodos
qualitativos e ciências sociais, pode ser encontrado em “Métodos qualitativos:
sua história na Sociologia e na Antropologia”, de Arthur J. Vidich e Stanford
M. Lyman (2006).
[3] Nos últimos três anos
venho utilizando observação-participante (trabalhos anteriores: Brito (2015;
2016); o atual, 2017-2018, está em desenvolvimento) a partir de referenciais
clássicos em metodologia, como Richardson (2008) e Minayo (2008) e, ainda, ao
“pai da observação-participante”, Malinowski (1978). No último ano, porém, a
partir de comparações entre o francófono Bruno Latour – especificamente sua
etnografia de laboratório de 1970 (LATOUR & WOOGAR, 1997) – e a opinião do
anglo-saxão Tim Ingold (2015), segundo o qual antropologia e etnografia seriam
campos distintos e não a última um subcampo da primeira, mais a experiência de
campo, tem me feito distinguir etnografia da observação-participante.
[4]
Neste primeiro ano de mestrado, descobri que o termo utilizado para isso entre docentes
e discentes é “Frankenstein”. Uma alusão ao conto de mesmo nome da autora
britânica Mary Shelley, no qual um cientista dá vida a um corpo cujas partes
foram retiradas de diferentes cadáveres.
[5]
Este problema é tão antigo quanto ao debate sobre a distinção entre ciências da
natureza e ciências sociais (ver. HAMLIN, 2011; PETERS, 2011).
[6]
Para uma análise mais detida sobre ontologia e sociologia – passando pelo
debate entre Gabriel Tarde e Emile Durkheim no quesito “sociedade” – ver “Two
ontological orientations in sociology: building social ontologies and blurring
the boundaries of the social” (KARAKAYALI, 2015).
[7]
Sobre a noção de “juízo dopado” em seu contexto – da crítica de Harold
Garfinkel à obra de Talcott Parsons – ver, “Etnometodologia” (HERITAGE, 1999).
[8]
A suspeita de que existiria uma possível relação entre a teoria ator-rede e os
estudos pós-coloniais não é recente (ver. BARBOSA, 2010); também já foi dito
que Latour – representante da teoria ator-rede – poderia contribuir para o
feminismo (HARAWAY, 1995). Ambas as posições carecem de substancialidade e
permanecem apenas como isso: suspeitas ou sugestões. Se há um desacordo entre a
teoria ator-rede e os estudos pós-coloniais, é o de que a sociologia
associativa (teoria ator-rede) pode ser tudo, menos crítica (LATOUR, 2012).
Para uma crítica a Latour e ao seu “colonialismo”, ver interessante crítica de
uma doutoranda, à época, em Antropologia Social da Universidade de Aberdeen, na
Escócia, chamada Zoe Todd, publicada no blog: antropologia crítica. Disponível
em: https://antropologiacritica.wordpress.com/2015/12/22/uma-interpelacao-feminista-indigena-a-virada-ontologica-ontologia-e-so-outro-nome-para-colonialismo/.
Acesso: 26 dez. 2017.
[9] É por esse motivo que
creio ser limitante classificar a etnografia como um “método”, como sugere
Martyn Hamme (1994). Na contramão desta posição, além do célebre Ingold que,
aliás, é um rival de Bruno Latour (cf. INGOLD, 2012), uma renomada antropóloga
brasileira, Mariza Peirano, professora aposentada da UnB, também defende a
ideia de que etnografia não é método (ver. PEIRANO, 2014). Para a autora,
etnografia era considerada arte (Evans-Prichard), comparação (Radcliffe-Brown),
dados para teoria (Malinowski) e, atualmente, método para antropologia, o que a
rebaixa.
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