[Apesar de se tratar da conclusão da pesquisa, incluo aqui o Resumo e o Abstract. Incluo, também, os agradecimentos em homenagem às pessoas que passaram por meu caminho e deixaram boas lembranças e aprendizados].
AGRADECIMENTOS
Aos meus amigos e amigas proporcionados/as pela
universidade: Wellington Estima, Roberto Santana, Risael Sibalde, Hacsa
Oliveira, Lara Albuquerque, Klebson Scooby. Especialmente à Camila Adriano. Não
poderia esquecer de Janaína Melo que permanece como “guia espiritual” para
os/as alunos/as de Ciências Sociais da Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Também a Josias de Paula e Júlia Benzaquen, por fazerem toda a
diferença enquanto docentes. Por último, aos muitos e muitas colegas que
compartilham música, poesia, alegria e descontração no “Conterrâneo’s
Epistemology Bar” – principalmente Acionildo e seu “apogeu da insignificância”.
RESUMO
Esse relato final de pesquisa é de um ano de pesquisa financiada
pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq). O objetivo de pesquisa foi investigar como agronomia e
ciências sociais lidavam com agrotóxicos. Os dados foram
coletados por meio de observação-participante e foram registrados em diário de
campo; entrevistas semiestruturadas foram feitas presencialmente e não presencialmente (por e-mail) e,
também, realizou-se análise
documental. As observações ocorreram em agronomia, nas aulas práticas e teóricas da
disciplina “controle de plantas invasoras”; em ciências
sociais, ocorreram na participação em um grupo de estudos chamado de Curupiras:
colonialidades e outras epistemologias. A análise documental se deu nos chamados “planos
político pedagógicos”
dos cursos, nas ementas de disciplinas (cadeiras) de ambos os cursos, e em parte do arquivo da universidade disponibilizado pela internet
ou por meio do acesso a documentos. A teoria
escolhida para realização da pesquisa foi a teoria ator-rede. Mais
especificamente, a partir da abordagem do sociólogo francês, Bruno
Latour. Não trabalhamos com a ideia de hipótese, mas sim com pressupostos. Pode-se dizer que o nosso pressuposto inicial, segundo o qual
agrotóxicos
seriam combatidos em ciências sociais, foi confirmado, visto que
devido a associação com a agroecologia, cientistas sociais cada vez mais se
opõem ao uso de agrotóxicos. O
nosso segundo pressuposto, segundo o qual agrônomos/as utilizariam e fariam pesquisas
sobre agrotóxicos,
por encontrarem utilidades e usos para eles, também pôde ser confirmado, pois foi possível
observar que tanto na documentação analisada quanto nas aulas, agrotóxicos
participam da formação de agronômos/as.
Palavras-chaves:
Agrotóxicos. Universidade.
Agronomia. Ciências sociais.
ABSTRACT
This final research report is the result of a
year of research funded by CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico - National Council for Scientific and
Technological Development). The objective of the research was to analyze how
different scientific areas of the same university, Universidade Federal Rural
de Pernambuco, deal with the same theme - pesticides. The question of the
research was as agronomy and social sciences deal with pesticides? Data were
collected through participant observation and non-participant and were recorded
in a field diary; Semi-structured interviews were done in person and online,
and also was held documentary analysis. Observations occurred in agronomy, in
practical and theoretical discipline about weed control; in social sciences,
participation in a study group called Curupiras: colonialities and other
epistemologies. The documentary analysis was of the educational plans of the
courses and the university archive available online or through access to
documents, such as teaching plans, provided by teachers or coordinators of the
two areas. The theory chosen to carry out the research was the actor-network
theory. More specifically, from the approach of French philosopher,
anthropologist and sociologist Bruno Latour. It can be said that the initial
assumption, according to which pesticides would be faced or combated in the
social sciences, has been confirmed as due to association with agroecology,
social scientists increasingly oppose the use of pesticides. The second
assumption, according to which agronomists would use and would do research on
pesticides, for finding utilities and uses for them, because in documentation
analyzed and in classes, they are present, participating in formation of
agronomies.
Keywords: Pesticides. University. Agronomy. Social
Sciences.
6. CONCLUSÃO: OS DIFERENTES SOCIAIS PODEM SER AGREGADOS?
Chegado
ao final de um ano de pesquisa, concluímos dizendo que dos objetivos almejados, não pudemos responder ao seguinte: “como a universidade lida com o tema”, visto que a própria teoria, ao nos orientar para traçar
diferentes conexões, não pode fornecer uma visão homogênea sobre o assunto. Por outro lado, o restante dos objetivos foram alcançados: sendo a nossa pergunta de partida a seguinte: “como agronomia e ciências sociais lidam com agrotóxicos?”, temos – agronomia utiliza
agrotóxicos pois encontra utilidade
em seus uso, no contexto de conexões observadas; herbicidas eram úteis no “controle de plantas invasoras” ou como parte do “manejo integrado
de pragas”; no caso de ciências sociais, identificamos que agrotóxicos estão ligados a “intoxicação alimentar” ou então
são considerados “prejudiciais à saúde humana” e, mais ainda,
devido a circulação de uma nova entidade, a agroecologia, seu convívio no local parece não ser tolerado.
Identificamos também que
agrotóxicos circulam na forma
de textos e estatísticas em
ambos os departamentos. Por último, não verificamos interdisciplinaridade entre os departamentos.
Nossos pressupostos eram a) agrotóxicos eram utilizados em agronomia pois
tinham alguma utilidade; e b) eram combatidos em ciências sociais pois eram considerados nocivos à saúde humana e o meio ambiente. Ambos foram confirmados. O grande dilema a que
chegamos ao fim de nossa pesquisa parece se condensar em uma questão muito mais
ampla e que está no cerne,
quem sabe, da própria relação
de alteridade. A princípio nós
só encontramos uma questão muito
simples: uma discordância
sobre um nome, uma palavra, um modo de nomear. Conforme caminhávamos, vimos que o modo de nomear
transportava significados e interesses diversos e, ao fim, antagônicos.
A separação entre “defensivo”
e “tóxico” não é, necessariamente, excludente: uma substância
não criada por mãos humanas pode ser
tóxica e utilizada como
defesa, como proteção de uma espécie contra seus predadores. Não importa então, a priori, o nome, pois aqui, eles podem muito bem ser
complementares: defensivos tóxicos e não tóxicos poderia ser uma classificação.
O
modo de nomeação não é
o verdadeiro problema. Apesar de ser
sua figuração. O problema – ou
um dos – é a forma com que se quer formatar as relações e como a influência política entra em ação. A grande diferença entre as ciências sociais e a agronomia, de acordo com
nossa visão, é que em
agronomia a formação parece ter um caráter estritamente técnico; enquanto que nas ciências sociais, as relações se pautam por
práticas de caráter mais sociais. Ora, mas não
é justamente esta separação
entre técnica de um lado, e social
do outro que nosso aporte teórico vem, nas últimas décadas, tentando superar (cf. “Jamais fomos modernos: ensaios de antropologia
simétrica” (LATOUR, 1994))?
A técnica não está separada do social, um é extensão do outro. Sem técnica, estaríamos presos apenas nas interações face a face – algo que não necessariamente representa atraso ou
negatividade, apenas reforça
que uma “sociedade”, ou a construção de um “mundo em comum”, macro, não seria possível; enquanto que apenas com a existência de equipamentos e técnicas, obviamente nada aconteceria, à exceção de alguma ficção
hollywoodiana à la Stanley Kubrick. Outro erro é achar que sem a técnica, ou sem o “desenvolvimento”, ou sem o Estado, cairíamos na guerra de todos contra todos hobbesiana, já
que o chamado estado de natureza
não se encontra nem mesmo na
natureza, entre macacos (CALLON & LATOUR, 1981) ou babuínos (LATOUR
& STRUMM, 1984).
O
que está em questão na
situação é como desejamos formatar as relações sociotécnicas (LATOUR, 1994; 2000). É possível, em agronomia,
ceder ao apelo de cientistas sociais e agroecólogos, e continuar suas práticas de “controle de plantas” e “manejo de
pragas”, sem o uso de agrotóxicos?
É possível para cientistas sociais e agroecólogos cooperarem com agrônomas e agrônomos sem que
estes e estas precisem aderir aos modos de existência da “agroecologia e
campesinato”? Aliás, como lidam agrônomos e cientistas sociais com a agroecologia em
sala de aula? Isto já é
assunto para outro projeto...
Como
sugestões de pesquisa, podemos dizer que na medida em que os meses foram
passando, ao mesmo tempo em que os dados se acumulavam, percebemos que o número
de conexões e ramificações realmente
eram impressionantes. Assim como o corpo humano se abre para um anatomista em
artérias e veias, fluídos etc., o mesmo ocorre agora com esse “social”
visto como associações e conexões, e não como um artefato que explica a realidade
(LATOUR, 2012). Nesse sentido, nossa pesquisa ignorou deliberadamente inúmeros documentos e associações. O que quer
dizer que cada livro vinculado aos planos políticos pedagógicos de cada curso, por si só,
já se desdobram em inúmeras outras conexões não analisadas em nossa pesquisa.
Além disso, e os estudos não trabalhados por nós? Relações de gênero, pós-colonialidade?
E toda a bibliografia que circula nos próprios livros, como os autores estão sendo incorporados? Um Boaventura de
Sousa Santos, inclusive, quais conexões são possíveis de se traçar entre os grupos que o utilizam? Mas mais
importante que isso é identificar
os aspectos de operacionalização metodológicos desta pesquisa. A pergunta de partida pode ser levemente modificada
e, assim, pode produzir outras pesquisas ou então, aprofundar esta que agora
vos comunico. Por exemplo: como é que outros setores, como a pós-graduação em entomologia agrícola,
lidam com agrotóxicos? Como é que o departamento de Educação da UFRPE lida com o mesmo assunto?
Por último, é preciso dizer que as conexões traçadas são fluídas, mas
duram o suficiente para que possamos registrá-las aqui nesta monografia: mas e o que fica entre
as conexões? Por exemplo: no Curupiras, ignoramos outras conexões, outros
projetos de extensão; ignoramos os recentes interesses do grupo de estudar pós-colonialidade e arte; ignoramos conexões
entre docentes de agronomia e empresas para fins de pesquisa; ignoramos
diversos outras formas de social que também circulavam pelo nosso campo. De que é feito o social, afinal? O que há entre as conexões se não, pura e simplesmente, outras conexões e
outras formas de se lidar consigo mesmo, com os outros e com o nosso mundo em
comum? A verdade é que pouco
conhecemos sobre o social e os potenciais guardados nessas relações. Eis o que
Latour chamou de plasma: as massas perdidas – o espaço existente entre as conexões e a infinidade de possibilidades existente
para gerar novas malhas nas redes.[1]
[1] Um possível projeto para levar adiante as conclusões desta pesquisa e
identificar elementos e práticas em comum por diferentes grupos, a despeito da
“passagem do tempo”, historicamente falando, é estudar a repetição de práticas
sob diferentes figurações. Mais especificamente tenho por vontade a criação de
um conceito vago, tal como a noção de arquivo, em Derrida (2001), e tão
genérico quando a ideia de conexão de Latour (2012), que possa servir
como forma de aferir ou medir repetições de práticas, como no exemplo da
acusação, denúncia e repetição das mesmas práticas denunciadas, mas em
aparência, diferentes. Em outras palavras, não se trata de dar solução ou uma
explicação teórica para questões reais e, literalmente, viscerais, como a
violência, mas sim tentar criar uma forma de aferir quando determinada prática
se repete. Foi possível observar os dois grupos se acusando, durante esta
pesquisa. Afinal, vivemos constantemente acusando uns aos outros e julgando-nos
idôneos, e não cor-ruptos (do latim, coração partido, rompido, não uno)
enquanto repetimos violências que não aceitamos assim as chamar. Por mais
evidente que sejam. A ditadura do proletariado; a “resistência” do oprimido
diante da violência do opressor são só formas em que a violência é figurada com
um ar de nobreza. É o que um amigo, Alexandro de Jesus, há pouco tempo alertou:
temos que identificar como o próprio processo de ascese, como a confissão, pode
ser um recurso mesmo para a prática do crime ou, em outras palavras, já não
poderíamos sustentar a pura exterioridade do Diabo em relação a Deus.
Parabéns Gabriel. Bela iniciativa. Abraços, caporal
ResponderExcluirGrande Caporal, obrigado!
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